terça-feira, 21 de abril de 2009

A música

Um dia a garota ouviu a música.

A música mexeu com ela. Pareceu adivinhar os seus pensamentos, os seus sentimentos.

E não eram só as letras e os versos. A melodia atingia em fundo um ponto dela que nunca tinha sido tocado. Cada acorde, cada tom, cada nota arrepiava um pêlo diferente de seu braço.

E ao chegar no refrão... o refrão lhe deu um frio na espinha. Um meio sorriso em seus lábios, e um traço de lágrima no canto do olho...

Talvez se escutasse mais acabaria encontrando a felicidade eterna... ou talvez apenas a angústia mais profunda (mas uma angústia confortável).

De qualquer forma não sabia se conseguiria ouvir mais naquele momento... se não deamaiaria... e parou, para voltar a ouvi-la mais tarde.

Naquele dia ela descobriu a música... e a música a descobriu.

domingo, 5 de abril de 2009

Qual é a cor do seu 6?

Quando eu era criança ganhei um carrinho de metal. Desses que as pessoas colecionam. Mas eu não brincava com ele, eu não gostei dele. Eu tinha outros carrinhos, mas daquele eu não gostei. A razão? A cor dele tinha um gosto enjoado. Não confundam: eu não tentava comer o carro ou enfiar ele na boca. Olhar pra ele me fazia sentir o gosto da cor. E essa cor me dava náuseas profundas. Pedi pro meu irmão jogar o carrinho no lixo.

Mais ou menos na mesma época minha mãe falou, no mês de junho, que a gente viajaria para o Rio de Janeiro em novembro. Chegou agosto e eu perguntei: "ué, a gente não vai?" Eu tinha confundido agosto com novembro, e minha mãe até riu porque os nomes dos meses nem se parecem. A verdade é que eu confundi porque pra mim os dois meses eram avermelhados. Um vermelho escuro, mas fraco, meio rosado.

E no meio de tudo isso eu também sabia que o 4 é laranja, que o 6 é verde, o 1 é preto...

Fui crescendo e tenho deixado de sentir tanto essas coisas (ou pelo menos deixado de prestar atenção nelas), mas sei que ainda as tenho. Por exemplo, eu continuo sentindo o cheiro de certos sentimentos.

Há um tempo atrás eu li na superinteressante que tem um fenômeno neurológico chamado "sinestesia". É verdade que há uma figura de linguagem na língua portuguesa, mas que provavelmente nasceu de poetas e escritores que foram inspirados por essa condição. É como falar do "som doce de suas palavras", "a cor calma dos olhos", etc.

Como eu disse, a sinestesia não é uma situação psicológica, é neurológica. Me desculpem a falta de conhecimentos ao falar disso aqui, e nem na internet eu achei isso direito, daí como não estou com a revista superinteressante na mão não vou poder dizer exatamente o que causa a sinestesia, mas é mais ou menos o seguinte: quando nascemos somos todos sinestetas ("portadores" da sinestesia). Com o desenvolvimento dos nossos neurônios e sinapses, por volta dos 3 anos de idade, algo vai apurando os sentidos e especificando-os no nosso cérebro. Algumas pessoas não passam - ou passam menos - por esse processo. Elas se tornam sinestetas, ou sinestésicos.

Há diversos tipos de sinestesia: táctil, olfativa, auditiva, visual, gustativa e combinações múltiplas entre elas

Não é algo que se deva confundir com memória. Há pessoas que acham que têm sinestesia apenas porque pensam em um gosto ou em um cheiro e logo pensam lembram de alguma situação ou vice-versa, isso porque vivenciaram naquela situação aquele gosto ou aquele cheiro. Isso é ativação da memória e associação das sensações e não sinestesia. Por exemplo: dizer que quando você lembra da sua infância sente cheiro de chuva ou gosto de tangerina é ativação da memória com algo que marcou sua infância...

Já li também que é uma condição (e não doença já que não causa mal) que uma em cada 15 mil pessoas têm.

Eu não sei se ainda posso me considerar um sinesteta, porque apesar de ainda sentir coisas as vezes, não é mais tão constante ou vivo quando era na minha infância.

De qualquer forma continuo achando a sinestesia uma benção.. a pessoa que a tem conhece um mundo só seu, que ninguém mais (a não ser raríssimas pessoas) disso iriam poder compartilhar.